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A falta de leitos de UTI e a morte evitável

No último dia 12/09/2018, foi exibido no telejornal Bom Dia Brasil, da TV Globo, o levantamento feito pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) sobre a falta de leitos de UTI no Brasil, onde foi trazido inclusive um raio X de todos os Estados brasileiros, incluindo-se, é claro, o Rio Grande do Norte.

A análise foi feita através dos Indicadores obtidos junto ao Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde do Brasil (CNES), do Ministério da Saúde - Competência mai/2018, e nos traz uma enorme preocupação diante dos dados apresentados referentes ao Estado do Rio Grande do Norte, onde foi apontado uma população de 3.507.003 e a existência de 601 leitos de UTI, sendo 330 do SUS e 271 do privado. Segundo o levantamento realizado, seria necessária a criação de 1.050 leitos de UTI do SUS, de acordo com o parâmetro de 1 a 3 leitos para cada 10.000 habitantes, oscilando assim entre 350 e 1050 leitos faltantes.

Ou seja, a má distribuição desses leitos e a situação a qual passamos de violência urbana, falta de educação no trânsito, falta de controle das endemias e epidemias, falta de controle das doenças crônicas na assistência primária levando a complicações tardias que necessitam de cuidados intensivos, a nossa necessidade de leitos seria mais próxima de 1050 leitos. Eu diria que há uma necessidade de pelo menos duplicar a oferta de leitos existente na rede pública.

Já na rede privada, a quantidade existente seria satisfatória, o que seria possível inclusive, ao meu sentir, a contratação por parte do Estado do RN de forma imediata e urgente de leitos de UTI na rede privada para suprir a falta de leitos do SUS e para salvar vidas.

Nunca é demais lembrar, que atualmente tramita perante a 4ª Vara Federal do RN, Ação Civil Pública, processo n. 0004715-12.2012.4.05.8400, ajuizado pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Norte, onde exige do Estado do RN a implantação de 157 leitos de UTI espalhados pelo Estado, quantidade esta que representava à época do ajuizamento da ação a sua realidade para fins de viabilização do primeiro acordo que não foi cumprido pelo Estado do RN.

Graças aos esforços de todas as partes evolvidas na lide, inclusive Ministério Público Federal e Estadual e a brilhante condução do processo por parte da competente magistrada Dra. Gisele Leite, que, diga-se de passagem, deveria servir de exemplo a ser seguido em todo o País para as demandas desta natureza, já foram implantados até o momento 60 leitos, sendo 20 leitos em Natal, 10 leitos em Mossoró, 10 leitos em Caicó, 10 leitos em Pau dos Ferros e 10 leitos em Currais Novos, sendo necessário registrar ainda, que somente ocorreu o cumprimento parcial do acordo celebrado entre as partes, em face de sequestro de verbas públicas realizadas através de decisões judiciais, estando ainda pendente de implantação 97 leitos.

É fato público e notório, que a falta de leitos de UTI prejudica a prestação dos serviços médicos por parte dos profissionais e estes não podem em hipótese alguma ser responsabilizados pelo caos da saúde pública, o que traz, por consequência, o comprometimento no atendimento da população, que em algumas situações chega a pagar com a sua própria vida.

O problema de má gestão na saúde não é novo, já vem de décadas, no entanto, caso inexistisse o acionamento do Poder Judiciário diante da omissão estatal, a situação poderia ser bem pior do que a atual.

Outro aspecto relevante que precisa ser abordado, é que a falta de leitos de UTI faz com que ocorra uma maior judicialização por parte dos pacientes em busca de uma vaga, o que transfere para o Poder Judiciário a administração da falência do serviço público de saúde, fazendo com que diariamente inúmeras medidas liminares tenham que ser deferidas, é claro devendo ser respeitada a regulação dos leitos para que ninguém possa passar na frente de outro ou para que o profissional médico não tenha que fazer a escolha de Sofia, e não muito raro, culmina inclusive na contratação de leitos de UTI na rede privada.

Parece-me que os gestores desconhecem os direitos previstos na nossa Constituição Federal que prevê de forma expressa o direito à saúde (art. 6o, art. 196 e 197), além do princípio da dignidade humana (art. 1º, III).

E ai eu trago os seguintes questionamentos: De quem é a responsabilidade pelas inúmeras mortes que acontecem quase que diariamente nos Hospitais públicos pela falta de leitos de UTI? Será que esta responsabilização é pessoal do gestor público? Será que as mortes poderiam ser evitadas?

 

Klevelando Augusto Silva dos Santos, advogado e professor universitário, sócio/gestor do Lucio Teixeira dos Santos Advogados, Assessor Jurídico do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Norte, Mestre em Administração pela UNP, especialista em direito civil e empresarial pela UnP, especialista em direito processual civil pela UNP, especialista em direito do trabalho e processo do trabalho pela Faculdade de Natal, autor do livro Qualidade de Serviços em Escritórios de Advocacia.


Email: klevelandosantos@ltsadvogados.com.br

 

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